Artigo originalmente publicado no Valor Econômico
Juristas deveriam administrar um órgão público por um tempo. Minha experiência como diretor da Faculdade de Direito da USP fez amadurecer minhas convicções sobre nossa estrutura de administração pública e a reforma que ela necessita. Hoje a reforma administrativa é tratada como um tipo de emplastro mágico. Em torno do tema costumam polarizar conservadores, corporativistas e ideólogos de uma reforma tão radical quanto inviável. A estabilidade mobiliza esforços, contra e a favor. É uma falsa discussão. A proposta de reforma proposta pelo governo anterior só turvou o debate, centrada em premissas falsas e prognose equivocada.
Nosso serviço público padece de cinco males. São eles: a isonomia plana; a indiferenciação de incentivos; o achatamento remuneratório; a grande disfuncionalidade alocativa; e a insulação orgânica. Enfrentar esses problemas é tão difícil quanto urgente.
Meritórias para combater o filhotismo e o apadrinhamento político, com o tempo, regras de isonomia entre servidores e de objetividade nas carreiras estatuiu um tratamento uniforme para colaboradores que não são iguais. Pessoas são diferentes nas suas capacidades, dedicação e engajamento. É preciso valorar essas diferenças e premiá-las para extrair de cada qual o seu melhor. Adotar uma visão de isonomia indistinta, que trata desiguais como se fossem equivalentes acaba por espantar talentos e remansar os desempenhos.
Para reverter essa situação algumas transformações são necessárias. É preciso oferecer incentivos para aqueles com maior dedicação ao serviço público. Listo algumas iniciativas necessárias: regulamentar e fazer periódicas e efetivas as avaliações de desempenho previstas desde 1998 na Constituição, como vem defendendo há anos, entre outros, Carlos Ari Sundfeld; tornar tão efetivo como criterioso o desligamento de servidores que reiteradamente (para além do período de um mandato, evitando perseguição política) performem abaixo dos níveis mínimos de desempenho objetivamente aferidos; flexibilizar as carreiras públicas de modo que, mediante critérios que levem em conta os resultados das avaliações periódicas, seja possível o aproveitamento de servidores conforme suas capacidades; desautomatizar a evolução na carreira, superando a regra de que só a passagem do tempo é suficiente para a evolução funcional. E, principalmente, é necessário rever os métodos de recrutamento. Hoje o modelo predominante de concursos interessa mais ao setor de cursos preparatórios do que ao bom recrutamento de servidores. Nesse sentido, boa iniciativa o Projeto de Lei (PL) nº 2258/2022, em tramitação no Congresso.
Carreiras públicas têm uma estrutura remuneratória invertida. A remuneração inicial costuma ser atrativa em comparação com atividades equivalentes fora do serviço público. Com o tempo a comparação vai se tornando desfavorável por conta do teto remuneratório e da baixa flexibilidade. Com isso, o servidor em fase final de carreira tem como incentivo apenas a aposentadoria. Impossível engajar alguém cujo sonho é deixar a carreira. É necessário rever totalmente a estrutura remuneratória, reduzindo a remuneração de entrada, elevando a parcela variável atrelada a desempenho e incentivos à assunção de maiores responsabilidades, atrelando maiores ganhos a metas objetivas.
Diz-se que o maior problema da administração pública é o inchaço de pessoal. Estudos, porém, indicam que o problema não está no número absoluto de servidores, mas na sua distribuição. Há pessoas demais em atividades que podem ser realizadas por sistemas digitais. E falta de gente em atividades-fim. Padecemos de disfuncionalidade na alocação. É preciso privilegiar as atividades-fim e de atendimento ao cidadão. Ampliar a digitalização e a informatização. Introduzir uma correlação funcional em cada setor entre líderes e liderados.
Ao longo do tempo, a criação de carreiras e de órgãos especializados produziu uma administração composta de inúmeros nichos. Isso legou uma cultura de defesa de cidadelas, pouca ou nenhuma mobilidade. É comum gastar-se mais tempo discutindo quem é responsável por uma providência do que resolvendo o problema. Reduzir o número de carreiras, aumentar a migração de servidores entre órgãos, criar núcleos de cooperação transversal, maximizar instrumentos de cooperação são medidas simples, mas que sofrem resistências dos que querem preservar seu cercadinho de atribuições.
Volto à minha experiência como diretor da Faculdade de Direito da USP. Perguntei ao chefe de um setor problemático o que seria necessário para melhorarmos. Surpreso, ouvi que nada. Listei os projetos que pretendia e, ao me ouvir, me disse que preferia deixar a chefia. Seguem os dias, chamei o chefe de outra área. Ele vem com outro servidor, mais velho. Ele calado e quem responde sempre é o acompanhante. Os indaguei e disseram que, como o mais experiente já havia incorporado o adicional de chefia, “passava o cargo” aos mais jovens. Informalmente seguia respondendo pela função.
Uma estrutura administrativa que incentiva esses comportamentos não pode prestar um serviço público de qualidade. Ela foi concebida para coibir os vícios de um passado não propriamente venturoso. É hora de repensá-la olhando para um futuro virtuoso, não só virtual.
Emenda ao PL nº 4.188/2021 visa permitir a atuação do tabelião de notas como mediador e árbitro.
O Senado Federal aprovou proposta de emenda ao PL nº 4188/2021 para incluir na lei que regulamenta os serviços notariais e de registro a possibilidade que o tabelião de notas atue como mediador e árbitro. A proposta foi considerada um “jabuti” pela comunidade arbitral, visto que não se relaciona com o texto central do PL, voltado a instituir um marco legal das garantias de empréstimos. A aprovação do projeto com a inclusão dessa emenda poderá causar desvirtuamento dos institutos da mediação e da arbitragem, opinião que é compartilhada pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem. O texto aprovado pelo Senado retorna agora para a Câmara dos Deputados para aprovação ou rejeição das emendas.
Tribunal Arbitral valida aplicação de multas pela ANTT no Contrato de Concessão da BR-040.
Um dos litígios envolvendo a Concessionária BR-040 S.A (Via 040) e a ANTT teve sentença arbitral proferida recentemente. A Concessionária havia requerido a invalidação de multas aplicadas pela ANTT em razão de irregularidades e descumprimentos contratuais, o que foi indeferido pelo Tribunal Arbitral. As multas discutidas totalizam mais de 24 milhões de reais. A sentença ainda deverá ser objeto de esclarecimentos, em razão de pedidos formulados por ambas as partes. A Via 040 também é Requerente de outro procedimento arbitral, que segue em trâmite, no qual pleiteia o reequilíbrio econômico-financeiro da concessão. Em paralelo, governo e Concessionária trabalham para a relicitação do trecho, já aprovada por Decreto Presidencial.
ANTT abre Audiência Pública acerca da proposta de regulamentação do Comitê de Prevenção e Solução de Disputas (Dispute Board)
No dia 08.ago.2023, a ANTT promoverá a sessão da Audiência Pública nº 6/2023, a fim de discutir a proposta de regulamentação do Comitê de Prevenção e Solução de Disputas, o chamado dispute board, a ser aplicado nos contratos de concessão de rodovia e ferrovia que envolvem a Agência e seus entes regulados. A sessão poderá impactar significativamente as futuras resoluções de conflitos que envolvam os referidos contratos. As sugestões e contribuições poderão ser enviadas até 31 de agosto de 2023.