A exigência da manutenção do chamado "desconto global" em aditivos contratuais (nos casos de contratos de empreitada por preço unitário)vem sendo aplicada por órgãos estaduais com fundamento no Decreto Federal 7.983/13. Este diploma consolida normas de 2011 e 2012 inseridas nas leis orçamentárias federais e espelham entendimento manifestado pelo Tribunal de Contas da União. Pela sistemática prevista no referido Decreto, ao celebrar um termo aditivo para inclusão de novos serviços, a Administração deverá apurar se o valor apontado pelo contratado para a execução do serviço se adequa ao percentual de desconto total concedido na licitação. Na hipótese de o "preço novo" não ser compatível com o desconto global da contratação, a diferença dos valores passará a ser retida da remuneração do contratado por meio de glosas nas medições futuras, isso a título da necessidade de se "reequilibrar" o contrato em favor da Administração Pública contratante. Num olhar superficial tal sistemática poderia ser considerada adequada, especialmente quando se pondera que sua construção teórica pela Corte de Contas da União está atrelada à apuração da prática do chamado "jogo de planilhas" nos contratos públicos. Porém, sua aplicação pela Administração Pública tem se mostrado vetor de situações de verdadeiro sufocamento econômico-contratual. A prática demonstra a deturpação da aplicação da metodologia de "reequilíbrio" em favor da Administração, que passa a impor um desconto ao contratado, independentemente de qualquer análise efetiva sobre a real situação econômico-financeira do contrato. Tal dinâmica transfere a responsabilidade das insuficiências dos projetos básicos e especificações técnicas disponibilizadas pela própria Administração aos licitantes à época do certame. Somado a esse aspecto, observa-se que princípios basilares, como a irretroatividade da lei e a intangibilidade do ato jurídico perfeito, têm sido ignorados pela Administração, haja vista a aplicação do "desconto global" aos aditivos feitos em contratos celebrados anteriormente à promulgação do Decreto. A ilegalidade da aplicação automática de descontos sobre a remuneração dos contratados para manutenção do "desconto global" se torna ainda mais evidente quando isso ocorre em contratos celebrados com recursos federais, mas não por membros da Administração Federal. Considerando o regramento expresso da Constituição da República sobre a separação das competências legislativas e administrativas, não se afigura admissível qualquer tipo de distorção do sistema de competências fundamentado na colaboração econômica promovida pela União aos Estados ou Municípios. Em recente caso patrocinado pelo escritório, a relação contratual contendida se mostrou marcada por tais vícios, que tornam inadmissível a aplicação de descontos sobre a remuneração mensal percebida pelo contratado com vistas à manutenção do "desconto global", concedido diante condições técnicas e econômicas diversas da visualizada na celebração do último aditivo ao contrato. Considerando a existência de cláusula compromissória e a obrigatoriedade de submissão de todos os conflitos surgidos na relação contratual à análise prévia de uma junta de resolução de conflitos (dispute resolution board), foi manejada medida judicial cautelar em caráter antecedente ao procedimento da junta de resolução de conflitos e à arbitragem, quando a adequação concreta da aplicação do desconto poderá ser apurada. À luz desse cenário e ressaltando a indispensabilidade de ser cumprida a disposição contratual que assegura ao contratado a submissão das controvérsias contratuais à Junta de Resolução de Conflitos, decisão do MM. Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo suspendeu aplicação de glosas às medições de serviços prestados pelo contratado, até que seja dada a ele a possibilidade de efetivamente discutir, em sede arbitral, a inaplicabilidade dos descontos no caso concreto.
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