O Poder Judiciário tem, com frequência, analisado ações questionando a possibilidade de criação de cargos para serem providos em comissão, sem a necessidade da prévia aprovação de seus ocupantes em concurso público de provas e títulos.
A Constituição Federal limita essa hipótese aos cargos destinados às funções de direção, chefia e assessoramento, conceitos que muitas vezes dão ensejo a controvérsias sobre a constitucionalidade de sua criação. Posições mais radicais em torno do tema provocam, por um lado, a limitação à atuação dos agentes políticos, eleitos, que necessitam de instrumentos que lhes permitam exercer a efetiva direção superior dos órgãos públicos (que incluem os cargos em comissão e as funções comissionadas) ou, por outro, a frustração da isonomia no acesso aos cargos públicos, por meio dos concursos públicos.
Recentemente, duas importantes decisões sobre esse tema foram tomadas pelo Supremo Tribunal Federal, preocupando-se com esses dois riscos.
A primeira delas foi exarada de forma colegiada pelo Plenário, em 19/12/2016, no julgamento da Petição 4.656, ajuizada pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado da Paraíba (SINJEP).
Nesse julgamento, o plenário Supremo Tribunal Federal, seguindo o voto da relatora (Ministra Carmen Lúcia), reconheceu válida decisão do Conselho Nacional de Justiça que considerou irregular a contratação de 100 (cem) assistentes de administração nomeados sem a realização de concurso público pelo Tribunal de Justiça da Paraíba. Entendeu-se possível que o controle administrativo seja exercido pelo CNJ nessa matéria, mesmo sem que o Poder Judiciário declarasse a inconstitucionalidade da criação dos cargos.
Já a segunda decisão, tomada nos autos da Suspensão de Liminar 1.042, também no dia 19/12/2016, foi proferida monocraticamente pela ministra Carmen Lúcia, que deferiu o pedido de suspensão dos efeitos de medida cautelar que havia sido concedida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que havia determinado a imediata exoneração de ocupantes de cargos nomeados sem concurso público.
Nessa decisão, reconheceu-se que a exoneração imediata de todo escalão superior da administração pública municipal seria capaz de gerar verdadeiro caos administrativo, com prejuízos à própria prestação dos serviços públicos municipais essenciais.
A Ministra destacou que não obstante a obrigatoriedade da realização de concurso público, ao julgar a ADI 4.125 o Supremo Tribunal Federal considerou necessário conceder um prazo de doze meses para que essa decisão fosse cumprida, de modo a que houvesse tempo hábil para uma substituição planejada dos ocupantes de cargos em comissão por servidores efetivos, o que exige aprovação de lei e realização dos concursos públicos.
Esse precedente reforça a necessidade de se modularem os efeitos (concedendo-se prazo para cumprimento da decisão) para que a correção de um vício não provoque efeitos colaterais graves em prejuízo da administração e da população.
As decisões revelam que ao lado do interesse público no provimento dos cargos públicos, em regra, por meio de concursos públicos de provas e títulos (ressalvadas as exceções permitidas apenas às funções de direção, chefia e assessoramento), que é geradora do direito difuso dos cidadãos de pleitearem – com respeito à isonomia – o acesso a esses cargos, está presente e deve ser preservado também o interesse na continuidade das atividades administrativas, que não pode ser objeto de decisões que promovam a repentina desestruturação de órgãos da administração pública, garantindo-se prazos razoáveis para a reorganização administrativa.
*Advogada do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados
NOTA
A advogada Mariana Magalhães Avelar foi aprovada em primeiro lugar em processo seletivo para ser professora voluntária na UFMG.
Publicação de Artigo
O artigo A comparative view of debarment and suspension of contractors in Brazil and in the USA, escrito pela advogada Mariana Avelar em coautoria com os professores Christopher Yukins e Cristiana Fortini, foi publicado na última edição da Revista de Direito Administrativo e Constitucional (A&C – R. de Dir. Adm. Const. | Belo Horizonte, ano 16, n. 66, p. 61-83, out./dez. 2016).