No sistema de controles da administração pública brasileira não faltam autoridades para fiscalizar e punir agente públicos e empresas contratadas pela administração pública por irregularidades cometidas. As sanções mais graves, que implicam proibição de contratar (como a declaração de inidoneidade) podem ser impostas pela administração (a antiga CGU, atual Ministério da Transparência, no caso da União Federal), pelos Tribunais de Contas e pelo Poder Judiciário (julgando ações de improbidade administrativa).
O Tribunal de Contas da União decidiu recentemente sobre a sistemática de cumprimento das declarações de inidoneidade nas hipóteses em que a pena for aplicada mais de uma vez ao mesmo interessado.
O TCU constatou, conforme explica Rafaella Spach, advogada da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados, que a então CGU limitava-se a fixar os períodos de vigência dos impedimentos de licitar de maneira vinculada ao momento de cada decisão condenatória, independentemente do número de condenações sofridas pela empresa.
Assim, se uma mesma empresa fosse condenada em processos diferentes, a extensão da pena ficaria dependente das datas em que as decisões fossem proferidas. Por exemplo, se duas condenações à suspensão de um ano fossem proferidas em uma mesma data, a empresa ficaria impossibilitada de participar de licitações por um ano apenas (não por dois); mas, caso houvesse um intervalo de dois meses entre as decisões, por exemplo, o impedimento vigoraria durante um ano e dois meses.
Reconhecendo que esses critérios eram impróprios e até certo ponto aleatórios, o TCU tratou de questões relacionadas ao prazo das sanções e buscou regras do direito penal, que aplicou por analogia, para disciplinar aplicação das proibições de contratar.
De acordo com a decisão do TCU, a pena máxima de afastamento dos certames licitatórios (de cinco anos) deve ser aplicada apenas para os casos em se reconheça a presença de especial gravidade e particularidades tais que exacerbem o dano causado pela conduta.
Havendo mais de uma pena aplicada, o Tribunal de Contas da União recorreu ao art. 75 do Código Penal, norma que fixa em 30 anos o prazo máximo de cumprimento de penas privativas de liberdade, ao mesmo tempo em que prevê a soma e unificação das penas e determina que, se houver condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, promove-se a unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido.
Rafaella esclarece que as deliberações mais relevantes do Acórdão do TCU no julgamento do TC 027.014/2012-6 foram a incorporação da regra do direito penal de aplicação sucessiva e somada (unificada) das sanções, observado o limite de cinco anos e a determinação no sentido de se refazer essa unificação (com o teto de cinco anos) sempre que houver novas sanções referentes a fatos anteriores ao início do cumprimento da sanção. O Tribunal também tratou de novas sanções por fatos posteriores ao início do cumprimento da pena e posteriores ao integral cumprimento da pena.
Para o sócio da Manesco Luís Justiniano Haiek Fernandes, é fundamental que os princípios do direito penal comum, em torno dos quais há garantias construídas há longo tempo, forneçam parâmetros para a aplicação das sanções administrativas. Isso proporciona aumento da segurança jurídica e fortalece a expectativa em torno da justiça das decisões dos órgãos de controle da administração pública.
Notas
A advogada Mariana Magalhães Avelar, da Manesco, apresentou no dia 23 de maio a palestra “Compliance na prevenção e combate à corrupção em licitações e contratos administrativos: uma perspectiva da Lei nº 12.846/2013”, durante o VIII Seminário de Pesquisa Administrativa da Faculdade de Direito da USP Ribeirão Preto.
Artigo do advogado Caio de Souza Loureiro, sobre os principais pontos do PPI – Programa de Parcerias de Investimento, instituído pela MP 727, foi publicado no portal Migalhas. Veja aqui.