Agentes públicos e privados podem e devem fomentar a igualdade racial por meio das suas práticas.
Essa é uma das conclusões dos debates ocorridos no evento “Riscos sociais nos contratos públicos e privados”. O encontro foi organizado pela Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial com o apoio da Manesco Advogados. A moderação foi feita por Maís Moreno, sócia e diretora de sustentabilidade e relações institucionais da Manesco, e Raphael Vicente, diretor geral da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial.
O seminário contou com as falas de Floriano de Azevedo Marques, sócio da Manesco e professor da FDUSP; Inês Coimbra, procuradora-geral do Estado de SP, e Walter Baére Filho, diretor jurídico do BNDES.
A iniciativa
A Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial foi fundada em 2015 com a ideia de reunir empresas para criar um caminho de combate à discriminação e ao preconceito racial. Segundo seu diretor, Raphael Vicente, a ideia inicial era tratar sobre o mercado de trabalho e o papel das grandes empresas para efetivar mudanças a nível nacional. Hoje, a Iniciativa reúne cerca de 70 companhias e, entre muitas ações, desenvolveu um sofisticado índice para auferir a igualdade racial nas empresas.
Arcabouço normativo no Brasil
Sobre como os contratos públicos podem efetivar estratégias antirracistas, segundo Floriano de Azevedo Marques, há todo um arcabouço jurídico para efetivar ações empresariais antidiscriminatórias e que permite ao Estado incluir cláusulas que fomentam o combate à discriminação de raça em seus contratos. Pode haver discussões no sentido de regularizar as iniciativas, mas, segundo o professor, esse pode ser um embate necessário – do mesmo jeito que o foi no período de efetivação de cotas raciais para as universidades públicas.
Azevedo Marques pontuou alguns marcos na criação dessas normas no país:
2002: Programa Nacional de Ações Afirmativas (Decreto 4.228/2002)
2003: Política Nacional de Igualdade Racial (Decreto 4.886/2003)
2009: Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Decreto 6.872/2009)
2010: Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010)
2013: Regulamentação do SINAPIR (Sistema Nacional de Proteção da Igualdade Racial) (Decreto 8.136/2013)
2022: Promulgação da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (Decreto 10.932/2022)
"É preciso elevar o custo de não se ter políticas afirmativas", afirmou Azevedo Marques. Segundo ele, vivemos hoje um momento no qual as empresas precisam realizar ações concretas no sentido de equidade, caso contrário, isso significa um risco, não só reputacional, mas também patrimonial. Além disso, também é necessário incutir obrigações jurídicas de fiscalização dessas ações.
"Se não houver um espraiamento das consequências do risco tomado de não coibir as práticas discriminatórias na sua cadeia de fornecedores, não é possível dar efetividade às políticas de combate à discriminação. Isso envolve, fundamentalmente, ação jurídica. Não apenas ação normativa, um processo já iniciado, mas ação de exigência efetiva e de instrumentos para cobrar a efetividade desses direitos", concluiu.
Nas relações econômicas das quais o Estado é parte, é função pública se solidarizar e tomar atitudes firmes frentes a casos de discriminação e inequidade.
Órgãos públicos, fiscalização e outras ações
O diretor jurídico do BNDES, Walter Baére Filho, afirmou que os atuais contratos do banco apresentam cláusulas de responsabilidade social bastante durante duras. No caso de desrespeito, há inclusive penalidades que podem chegar até a conclusão antecipada do contrato. “O Brasil não pode permitir e fomentar a ação de empresas desmatadoras, que praticam discriminação ou usam de mão de obra escrava”, afirmou.
Um outro caso prático de ação do BNDES é na estruturação de um museu sobre a história afro-brasileira no Rio de Janeiro, na área do cais do Valongo. A revitalização da área e o projeto para a construção do museu conta com cláusulas que incentivam a participação de empresas que valorizem ações pela igualdade racial. “É necessário usar o tamanho e o peso do BNDES para liderar o sistema financeiro num movimento importante para a sociedade brasileira”, afirmou Baére Filho.
No contexto dos debates, Inês Coimbra vislumbra dois desafios principais. O primeiro é deixar claro que há um problema de racismo no país, com diversas consequências. Apesar de parecer ser algo evidente (tendo em vista o número de pessoas negras em cargos de diretoria de grandes empresas, por exemplo), essa luta precisa dos esforços de todos. “É preciso que a gente pactue que este é realmente um problema. Os tomadores de decisão precisam se sensibilizar para isso”, declarou.
O segundo desafio, muito atual, é construir estruturas que possam avaliar a eficiência e eficácia das políticas públicas antirracistas.
Além das iniciativas na busca de efetivar uma maior equidade racial nos contratos, Maís Moreno também lembrou de ações que podem ser feitas por pessoas físicas. Uma dessas iniciativas é o “Programa Adote um Aluno”, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. O programa arrecada bolsas de auxílio permanência para apoio e formação de alunos.
Na última semana, o Ministério do Meio Ambiente, com o apoio do BNDES, do Instituto Chico Mendes De Conservacao Da Biodiversidade e do Programa de Parcerias de Investimentos, lançou o primeiro edital de concessão florestal com foco em restauração e recuperação da Mata Atlântica Nativa.
Para além das instituições públicas, a Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques, Sociedade de Advogados também participou da modelagem do projeto, juntamente com a FGV Projetos e a STCP Engenharia de Projetos Ltda.
O projeto combina a preservação do meio ambiente e viabilização de interesses econômicos nas Florestas Nacionais (Flonas) de Itatiba (PR), Chapecó (SC) e Três Barras (SC). São previstos investimentos de R$ 430 milhões na operação florestal e na cadeia da restauração da Mata Atlântica ao longo dos 35 anos de contrato.
O contrato é pleno de inovações. Uma delas é a permissão para exploração de crédito de carbono. Essa é uma das chaves para possibilitar o reflorestamento das regiões com espécies nativas da mata atlântica. Hoje, as três Flonas estão em grande parte ocupadas por plantio de pinheiros, espécie que não é nativa do Brasil. "O contrato possibilita o manejo sustentável da atual vegetação e, com os créditos de carbono, mantém a atratividade da concessão mesmo no caso de algo tão custoso quanto o reflorestamento", observa Tatiana Cymbalista, sócia da Manesco.
Outra inovação deste contrato é abordar cláusulas de equidade de gênero. Esse é o primeiro edital do BNDES com políticas de contratação de mulheres e de capacitação sobre igualdade de gênero e equidade salarial, como destaca Maís Moreno, sócia da Manesco e uma dos responsáveis pela modelagem do projeto.
A licitação dessas 3 Flonas permitirá identificar o apetite do mercado para uma nova rodada de concessões de florestas públicas e áreas verdes, já no âmbito das alterações legislativas que ampliaram as possibilidades de concessão envolvendo créditos de carbono.
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